Desde 2014, a Associação Brasileira de Psiquiatria – ABP, em parceria com o Conselho Federal de Medicina – CFM, organiza, em território nacional, o Setembro Amarelo. O dia 10 deste mês é, oficialmente, o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, mas a iniciativa acontece durante todo o ano. Atualmente, o Setembro Amarelo é a maior campanha anti estigma do mundo. (Fonte: setembroamarelo.com)
Para falar sobre o tema, convidamos o Dr. Carlos Henrique Hamamoto Mitsugui, Psiquiatra que atende na ARSS - CAPS II e CAPS AD III:
É possível determinar o perfil de quem tem tendência a cometer suicídio?
Sim. O paciente com tendência a cometer suicídio tem alguns fatores de risco, seja na história pregressa (algum familiar que cometeu/tentou suicídio), transtornos mentais, quadro depressivo e uso de substâncias.
É importante derrubar por terra aquele mito de que a pessoa que vai cometer suicídio não avisa, normalmente o paciente que vai tirar a própria vida acaba avisando. Ele busca a atenção primária ou a especialidade (psiquiatria) para pedir algum alívio para o sofrimento. Quem comete o suicídio normalmente o faz em uma situação de impulso em que o indivíduo não está conseguindo lidar com um grande sofrimento emocional, que leva a um quadro de angústia crônica; e na ânsia de eliminar aquele sofrimento ele acaba flertando com a morte achando que essa poderia ser uma forma de alívio.
Cabe ainda ressaltar que não é apenas a depressão que leva à ideação suicida, existem outras patologias, outras interferências em psiquiatria que acabam levando a um risco aumentado. Não é tão divulgado, mas existe uma interferência maior até de outros transtornos no risco de suicídio do que a própria depressão. Pouco se fala, mas a depressão bipolar ou quadro de estado misto de humor no transtorno bipolar leva a um risco muito maior do que a depressão unipolar (depressão pura).
Uma mudança brusca e negativa, ou mesmo uma depressão, pode provocar uma atitude suicida?
Uma mudança brusca e negativa a um quadro depressivo, acaba levando a um risco aumentado, principalmente dentro daquela “bagunça de sentimentos” se o paciente estiver impulsivo, irritado, numa situação em que ele não lida bem com os sentimentos, mais ainda do que só um quadro depressivo. Quando o paciente está profundamente deprimido ele tende a ter uma falta de energia até para cometer alguma tentativa de suicídio ou planejar algo. Já um paciente em um estado misto do transtorno bipolar tem uma mistura de sentimentos – a parte ruim dos pensamentos depressivos, mas ele tem um ímpeto, uma coragem, um impulso aumentado e isso acaba potencializando bastante o risco de suicídio.
Os casos de reincidência são comuns nas tentativas de suicídio?
Sim. O paciente que já cometeu alguma tentativa de suicídio ou tem histórico de automutilação por exemplo, tem sim um risco aumentado. Todos esses são critérios de fatores de risco que exigem um olhar mais aprofundado sobre um grupo de pacientes. Então esse paciente que já cometeu uma tentativa possui um risco maior.
Sendo assim, não basta identificar o risco, mas aprofundar o atendimento. Procurar investigar se é necessário um diagnóstico/tratamento diferenciado, se realmente o diagnóstico está correto ou se precisa repensar sobre o caso daquele indivíduo.
O que fazer quando uma pessoa fala em tirar a própria vida?
A primeira conduta nesse paciente que traz essa demanda, que revela pensamentos de ideação ao suicídio deve ser o acolhimento. Primeiramente ouvir, deixá-lo livremente falar sobre. Pode ser algum leigo ou profissional da saúde, e em seguida fazer o devido encaminhamento. Deve-se incentivá-lo a buscar ajuda profissional, podendo ser inicialmente com a psicologia, mas fundamentalmente deverá passar por atendimento psiquiátrico.
É importante ressaltar que não é apenas uma questão de ouvir e dar o suporte, mas as ideações suicidas e as tentativas de suicídio estão intimamente ligadas a doenças psiquiátricas e a transtornos mentais (94% das tentativas de suicídio estavam ligadas a transtornos psiquiátricos). Se o paciente não receber o atendimento ou o tratamento for inadequado, pode acabar terminando com um desfecho trágico de uma vida vir a ser pedida.
Em contraponto, o atendimento adequado, o tratamento eficiente com o diagnóstico correto, as medicações e a psicoterapia assertiva afastam ou até eliminam a ideação suicida.
O que você recomendaria para quem tem pensamentos suicidas?
É importante orientar essa pessoa que está em grande sofrimento de que se trata de um sintoma, um estado patológico em que quando ela encontrar o tratamento adequado esse sintoma vai desaparecer. Deve-se fazer com que o indivíduo entenda de que não se trata de falta de motivação, falta de fé (não é uma questão religiosa) já que cada vez mais as pessoas vêm buscando ajuda na esfera religiosa. É importante não misturar crenças e valores sobre esses sintomas, já que sendo bem tratados eles desaparecem.
Dr. Carlos ressalta que o Setembro Amarelo, mês de prevenção e combate ao suicídio, é importante para que esse assunto seja abordado no sentido de melhorar a informação, diminuir o estigma, e que as pessoas entendam que são características patológicas e que o tratamento adequado é libertador e traz novamente o equilíbrio ao indivíduo.
Dr. Carlos Henrique Hamamoto Mitsugui é Psiquiatra Graduado pela ULBRA em 2017 e Membro Titular da Associação Brasileira de Psiquiatria - ABP desde 2012.